segunda-feira, 27 de maio de 2013

PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO


             Processo administrativo-tributário é o conjunto de atos necessários à solução, na instância administrativa, de questões relativas à aplicação ou interpretação da legislação tributária. Considera-se processo administrativo-tributário aquele que versa sobre a aplicação ou a interpretação da legislação tributária. Observe-se que o processo pode ser administrativo mas não versar sobre a interpretação ou aplicação da legislação tributária, caso em que não será denominado administrativo-tributário.
Algumas entidades tributantes estabelecem diferenças entre procedimento administrativo-tributário e processo administrativo-tributário. Em sentido estrito, o procedimento administrativo-tributário compreenderia o conjunto de atos necessários à interpretação ou aplicação da legislação tributária quando não houvesse litígio. Seria a forma estabelecida na legislação para o tratamento, perante a Administração, das questões administrativo-tributárias não conflituosas. Já o processo administrativo-tributário consistiria no conjunto de atos necessários à solução administrativa de um litígio. Ou seja, o processo administrativo-tributário seria sempre litigioso e se iniciaria com a impugnação (contestação) apresentada pelo sujeito passivo.
Todavia, a legislação tributária do Estado de São Paulo não faz clara distinção entre procedimento e processo administrativo-tributário, adotando esta última denominação para todos os casos, litigiosos ou não.
À primeira vista, a idéia que se tem do processo administrativo-tributário é a de que envolve, de um lado, o sujeito passivo e, do outro, a Administração, a quem cabe decidir a questão. Mas se é a Administração quem decide, como pode haver isenção no processo administrativo-tributário? Em tese, no processo administrativo-tributário, a Administração não decide em causa própria. Seu objetivo precípuo é avaliar a legalidade dos atos praticados por seus agentes, devendo anular os atos revestidos de ilegalidade.
Em termos de apresentação e aparência, o processo administrativo-tributário é idêntico ao processo judicial, sendo organizado em ordem cronológica, na forma de autos forenses, com as folhas numeradas e rubricadas. Comparado ao processo judicial, o processo administrativo-tributário é menos formal, motivo pelo qual, no encaminhamento e na instrução deste, ter-se-á sempre em vista a conveniência da rápida solução, não se formulando senão exigências estritamente necessárias à elucidação da matéria.
O processo administrativo-tributário é gratuito, nele não incidindo custas, emolumentos ou tributos de qualquer natureza, excetuado o pagamento de taxa pelo fornecimento de cópia reprográfica, ou outro meio de reprodução, de peça processual requerida pelo administrado.
O procedimento administrativo dá-se início através do crédito tributário que é constituído pelo lançamento, que tem por finalidade verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária. Esta é a inteligência do art. 142[1] do Código Tributário Nacional.
O contribuinte autuado, no entanto, tem o direito de insurgir-se contra o lançamento, apresentando, para tanto, sua defesa perante o órgão competente que, em algumas esferas de governo, pode ser um Tribunal especializado, sem jurisdição, ou um Conselho de Contribuintes. O sistema adotado no Brasil é o dualista, onde os órgãos julgadores não dispõem de jurisdição, portanto, não encerram o conflito. Mas devem obedecer a certos princípios básicos.
Os princípios legais do ‘devido processo legal’ e da ‘defesa do juízo’ foram consagrados em vários convênios interamericanos, como o de São José da Costa Rica, em novembro de 1969:

"Toda pessoa tem o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente pela lei, para sustentação de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para determinação de seus direitos e obrigações de ordem civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outro caráter”.

Desse modo, o processo administrativo-tributário obedece, entre outros requisitos de validade, aos princípios da publicidade, da economia, da motivação e da celeridade, assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
No Direito Administrativo encontramos vários princípios que, por sua vez, estão lastreados na Constituição Federal. Estes princípios são os mesmos que norteiam o processo administrativo em geral.
Com a Constituição de 1988 restou garantido, no art. 5º LV, o contraditório e a ampla defesa a todos os litigantes, seja no processo judicial, seja no processo administrativo.
Vejamos, então, outros princípios que norteiam o processo administrativo:
1. Princípio da legalidade: informa toda a atividade ‘de autoridade’ da Administração como tal. O processo administrativo como meio de desenvolvimento da atividade como ‘potestade pública’ do estado a ele se cinge irrestritamente.
 2. Princípio da Imparcialidade: é um princípio decorrente do art. 5º, I da CF, segundo o qual todos são iguais perante a lei (isonomia). Dirige-se ao legislador, mas a interpretação correta é a de que também imparcial deve ser a Justiça, assim como a Administração Pública. Entretanto, a atividade administrativa se desenvolve em plano de parcialidade, no sentido do atendimento do interesse público, o que torna a Administração, parte nos conflitos de interesse entre o Estado e o particular. É possível, entretanto, distinguir as duas posições, pois imparcialidade significa tratamento igualitário aos administrados, enquanto se visa ao interesse público. O problema é mais psicológico, pois o direito positivo deixa claro o comportamento obrigatório do administrador.
              
 3. Princípio da Oficialidade: em matéria de processo administrativo, este princípio está ligado à idéia de que cabe à administração tomar a iniciativa para a realização do interesse público, o que se aplica não só quanto à instauração do processo administrativo mas também quanto ao seu desenvolvimento e impulso processual. Admite-se que o particular provoque a instauração do processo, mas o impulso é afeto à Administração, que não deve paralisar o procedimento por inércia do particular, ligando-se portanto a um princípio geral de Direito Administrativo, que é o princípio da indisponibilidade do interesse público.
               
 4. Princípio do Informalismo em favor do Administrado: O processo administrativo é mais flexível que o judicial, no sentido de se permitir melhor co-participação do administrado na busca da verdade.
               
5. Princípio da Verdade Real: afasta, no processo administrativo (ou pelo menos o reduz sobremaneira), a possibilidade de se chegar às chamadas verdades meramente processuais. O poder de investigação da administração, para esse fim, é o mais amplo possível, para informar sua decisão.
                
6. Princípio do Devido Processo Legal: contraditório que é essencial ao processo administrativo. A punição administrativa sem o due process of law é nula, como têm entendido nossos Tribunais.
               
7. Princípio da Publicidade: Os atos administrativos são, em princípio, públicos. Aliás, a Constituição do Estado de São Paulo (art. 59) o diz expressamente, com as exceções legais de sigilo no interesse da Administração.

Assegura, também, a Carta Magna, em seu art. 5º LIII que, "ninguém será processado nem sentenciado senão por autoridade competente." Esta garantia, que a primeira vista aplicar-se-ia apenas ao processo judicial, porquanto a sentença é um ato exclusivamente judicial e decorrente do processo, entretanto alguns doutrinadores invocam o dispositivo para embasar o "princípio do julgador competente".
A causa deve ser julgada por juiz (autoridade julgadora) imparcial, competente, pré-constituído pela Lei, isto é, constituído primeiro do que o fato a ser julgado. A garantia abrange o processo civil, penal e administrativo.
Este princípio, que expressa o direito fundamental à autoridade julgadora competente, decorre explicitamente da dicção dos incisos XXXVII e LIII do art. 5º da Constituição Federal, segundo os quais não haverá juízo ou tribunal de exceção e ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente, e condiciona todas as esferas administrativas, Federal, Estaduais e Municipais, a prover estrutura jurídica e funcional aptas para que a lide tributária possa ser conhecida por julgador ou tribunal administrativo competente, pré-constituído pela Lei, ou seja, constituído de acordo com regras vigentes e válidas antes da formalização da lide tributária.
Como todo processo, o duplo grau de jurisdição ou cognição, está subentendido no art. 5º, LV da Constituição Federal, quando trata do contraditório, da ampla defesa, como meios e recursos a ela inerentes. Justifica a doutrina que a revisão do julgamento atende a uma necessidade de qualidade e segurança da prestação estatal ao mesmo tempo, que atende a ampla defesa.
O processo administrativo surge sempre de um procedimento tendente a verificar a ocorrência do fato gerador do tributo, a qual o Código Tributário Nacional, art. 142, define como lançamento.
O crédito tributário é originário da ocorrência de um fato jurídico, especificado na lei como capaz de gerar o tributo a ser pago pelo contribuinte. O não recolhimento implicará num procedimento administrativo que assegurará ao infrator o direito de defender-se com as provas que, obviamente, lhe digam respeito, que serão apreciadas livremente pelo julgador.
            Há, no entanto, a necessidade de fixação dos fatos por instrumentos ou provas idôneas, o funcionamento da atividade probatória no processo decorre de um método que é necessário observar e vincula as partes e o juiz: trata-se do processo ou procedimento probatório estabelecido pelo direito positivo. Tanto o contribuinte como a Fazenda Pública pode produzir provas, portanto, o ônus da prova não está adstrito ao impugnante.
         As provas podem ser meramente documental, apresentadas de pronto pelo contribuinte, realização de diligência e pericial, desde que sejam imprescindíveis à apuração dos fatos.
         A Lei nº 10.654/91, ao tratar das provas a serem produzidas no processo administrativo assim estabelece:
Art. 4º. A autoridade julgadora, na apreciação das provas, formará sua convicção segundo os princípios do livre convencimento em decisão fundamentada, consoante razões e argumentos técnicos e jurídicos.
               
 § 1º. A autoridade julgadora determinará, "ex officio" ou atendendo a pedido da parte interessada, a realização de diligência e perícia que entender necessárias.
              
 § 2º. As diligências e perícias serão determinadas ou deferidas mediante simples despacho nos autos, dispensada sua publicação no Diário Oficial do Estado.
 § 3º. Na hipótese de determinação, "ex officio", de perícia, a parte interessada será intimada para, no prazo previsto no artigo 14, III, formular questões e apresentar assistente técnico.
               
§ 4º. Na hipótese de pedido de diligência, a parte interessada deverá descrever a questão controvertida que entenda exigir apuração e, nos casos de pedido de perícia, deverá formular os quesitos a serem respondidos, indicando, se entender necessário, seu assistente técnico.
              
 § 5º. Deferido o pedido de diligência ou de perícia, a autoridade julgadora administrativa encaminhará os autos à Diretoria de Administração Tributária - DAT quando for necessário à instrução do processo.
               
§ 6º. A autoridade julgadora, fundamentadamente, poderá rejeitar o pedido de diligência ou de perícia.
                         
 § 7º. Na hipótese de ser o resultado da perícia contrário ao lançamento efetuado nos autos, o Julgador Tributário devolverá o processo, ao autuante, para suas considerações, observado o prazo previsto no artigo14, II, "c".
         
 § 8º. Quando a perícia e a diligência não puderem ser realizadas no Tribunal Administrativo Tributário do Estado - TATE, o respectivo processo deverá ser remetido à repartição fazendária competente.
        
 § 9º. A equipe de diligência ou de perícia será integrada, necessariamente, pelo autuante, como assistente, por parte do sujeito ativo da obrigação tributária e por técnico, nessa qualidade, indicado, facultativamente, pelo sujeito passivo da autuação.(Lei nº 10.763/92)

No âmbito federal, o Decreto nº 70.235/72, de igual modo, prevê a produção destas mesmas provas.
A fiscalização tributária, conforme disposto no art. 195[2] do CTN, tem poderes para examinar mercadorias, livros, arquivos, documentos, papéis e efeitos comerciais ou fiscais dos contribuintes.
Em um procedimento fiscalizatório, o agente da Administração tem acesso a toda a documentação fiscal/comercial do contribuinte fiscalizado, o que possibilita conhecimento sobre a real situação econômica ou financeira do mesmo, todavia, essas informações obtidas devem ficar restritas ao âmbito de divulgação estabelecido pela lei.
Dessa forma, coexistem harmonicamente os institutos do sigilo fiscal e da publicidade do processo administrativo tributário, pois o sigilo fiscal é direcionado às informações obtidas pelo agente público para poder determinar o crédito tributário, enquanto a publicidade é relacionada ao próprio crédito tributário, bem como ao processo administrativo a este relativo.
Quando analisada a natureza do processo administrativo tributário, fica clara a impossibilidade de entendimento diverso, pois, ao apurar-se débito do contribuinte, apura-se crédito da Fazenda Pública, revestindo-se conseqüentemente de natureza pública o respectivo processo, dado o próprio interesse coletivo envolvido.
           Enfim, o processo administrativo tributário brasileiro, apesar de condignamente concebido pela Carta Magna, ainda se apresenta tímido, sem alcançar, vastamente, o seu fim maior, que é realizar a justiça administrativa, afastando a discricionariedade do órgão tributante e a arbitrariedade.
            Considerando pois a teoria dualista adotada pelo sistema jurídico brasileiro, em que o julgamento administrativo não encerra a questão, propiciando a repetição de toda a discussão perante o Poder Judiciário, tem-se que o processo administrativo não cumpre a sua finalidade, apenas posterga a resolução do problema, muitas vezes, em prejuízo do próprio administrado.
            No nosso entendimento a justiça administrativa não vem sendo alcançada como se espera, seja porque falta independência funcional dos julgadores que, quer queira ou não, normalmente seguem uma orientação do ente tributante, que os impede de livre apreciar o conflito; quer seja pela morosidade no julgamento, em flagrante prejuízo à administração pública; quer seja, ainda, porque, considerando que o nosso sistema adota a teoria dualista, que implica em processos autônomos nas esferas administrativas e judicial, ao cabo do processo administrativo, permanecendo incólume o lançamento, o contribuinte se utilizará das vias judiciais, repetindo todo o processo.
            Outro entrave à efetivação da justiça administrativa constitui na impossibilidade de reconhecimento da inconstitucionalidade de normas tributárias, como se apresenta, por exemplo, a do Estado de Pernambuco.
            Entendemos que se faz necessário repensar o contencioso administrativo em vigor em nosso país pois, da forma como posto nas mais variadas leis existentes, a justiça administrativa, para o qual se propõe, constitui mais um entrave à célere solução da controvérsia tributária.
   
JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Tipo:    Apelação cível em mandado de segurança
Número:          1997.014060-6
Des. Relator:   Des. João Martins.
Data da Decisão:        29/08/2002

Apelação cível em mandado de segurança n. 1997.014060-6, de Blumenau.
 Relator: Des. João Martins.

    MANDADO DE SEGURANÇA - TRIBUTÁRIO - NOTIFICAÇÃO FISCAL - DEFESA ADMINISTRATIVA - EXIGÊNCIA DO DEPÓSITO PRÉVIO - LEGALIDADE - RECURSO NÃO PROVIDO.

     A exigência de prévio depósito do montante integral da dívida tributária como requisito do recebimento e trâmite de reclamação administrativa está em consonância com os preceitos constitucionais, conforme precedentes do STF e desta Corte.
     "A legislação fiscal Estadual pode regular o processo administrativo tributário. E o artigo 141, incisos I e II, do Decreto n. 22.586/84, quando exige o depósito prévio em dinheiro do montante da infração, ou a prova de seu recolhimento anterior, não ofende o princípio constitucional contido no artigo 5º, item XXXIV, letra "a", da Constituição de 1988" (ACMS n. 98.011262-1, de Criciúma, Rel. Des. Solon d'Eça Neves).
                  Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível em mandado de segurança n. 97.014060-6, da Comarca de Blumenau, em que é apelante Fly Importadora Ltda., sendo apelado o Estado de Santa Catarina:

                 ACORDAM, em Quinta Câmara Civil, por votação unânime, conhecer do recurso voluntário e negar-lhe provimento.
                  Custas na forma da lei.

                 I -RELATÓRIO:

                 Fly Importadora Ltda., qualificada nos autos, impetrou mandado de segurança contra ato do Sr. Gerente Regional da Fazenda Estadual, igualmente qualificado, que denegou o recebimento das reclamações contra notificações fiscais por ausência de prévio depósito.
                  A impetrante foi autuada por não ter recolhido o ICMS, por ela própria apurado, no livro de registro de apuração do ICMS. Aduz que protocolizou reclamação junto ao impetrado, e que não foi recebida ao argumento de que deixou de depositar o montante do imposto lançado. Contra esse ato insurge-se no mandamos, sustentando que o artigo 141 do Regulamento das Normas Gerais de Direito Tributário do Estado de Santa Catarina é inconstitucional.
                  Após demais considerações, postula a concessão da liminar, bem como a segurança definitiva para afastar a exigência do depósito, tendo em vista a flagrante violação ao texto constitucional no que tange ao contraditório e a ampla defesa.
                  Valorou a causa e juntou documentos.
                  A liminar foi indeferida (fls. 35,v e 36).
                  Notificada, a autoridade coatora apresentou informações, alegando em síntese a inexistência de direito líquido e certo. No mérito, defendeu a legalidade da exigência do artigo 141, I do Regulamento das Normas de Direito Tributário do Estado de Santa Catarina aprovado pelo Decreto n. 22.586/84.
                 O Ministério Público ofereceu parecer, manifestando-se pela denegação da segurança pleiteada (fls. 49/51).
               Sentenciando, a magistrado a quo denegou a segurança por inexistir, no ato da autoridade coatora, a violação do direito líquido e certo alegado pela impetrante.
                  Irresignado, apelou o vencido aduzindo os argumentos anteriormente apresentados (fls. 60/78).
                  Em contra-razões o apelado requereu a manutenção da sentença recorrida (fls. 83/91).
                  Após a manifestação do Ministério Público de Primeiro Grau, ascenderam os autos a esta Instância, tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça , em parecer da lavra do Procurador Wlaumar Alves da Silva opinado pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 100/101).

                 É o relatório.

                 II -VOTO:
                  Trata-se de apelação cível em mandado de segurança interposta por Fly Importadora Ltda., inconformada com a prestação jurisdicional entregue nos autos do Mandado de Segurança impetrado contra ato do Gerente Regional da Secretaria de Estado da Fazenda de Santa Catarina, a qual , reconhecendo a inexistência de violação a direito líquido e certo, denegou a segurança.
                  Com relação ao mérito, tem-se que o procedimento administrativo fiscal tributário, no Estado de Santa Catarina, é regulado pela Lei n. 3.938/66, com a redação que lhe deu a Lei n. 5.644/79 e pelo Decreto n. 22.586/84 e que, em ambos dispositivos legais, está disposto que não caberá reclamação ou recurso contra notificação fiscal relativa a crédito tributário lançado nos livros fiscais próprios, pelo próprio devedor, a não ser que seja procedido ao depósito prévio pelo reclamante, do montante total em dinheiro conforme o estabelecido nos dispositivos supra citados.
                 Assim, é inquestionável que a autoridade fazendária apenas cumpriu o prescrito na legislação tributária estadual, sendo que o ato administrativo obedeceu o preceito legal, não podendo o mesmo ser eivado de ilegalidade.
                  Ademais, o Supremo Tribunal Federal vem entendendo estar em consonância com os preceitos constitucionais a exigência do depósito prévio do montante integral, como requisito do recebimento e trâmite de reclamação administrativa, conforme se extrai do seguinte aresto:

                 "RECURSO EXTRAORDINÁRIO - ADMINISTRATIVO - RECURSO - DEPÓSITO PRÉVIO.

                 2. O Plenário do STF, no julgamento do RE n. 210.246, decidiu pela constitucionalidade da exigência do depósito prévio do valor da multa, como condição de admissibilidade do recurso administrativo. 3. Precedentes. 4. Recurso extraordinário conhecido e provido" (RE n. 210.244/GO, Min. Néri da Silveira, DJ de 27/1/98, p.29)”.
                 Nosso tribunal não discrepa:
                 "TRIBUTÁRIO - ICMS - RECURSO ADMINISTRATIVO - EXIGÊNCIA DE DEPÓSITO PRÉVIO - 'GARANTIA DE INSTÂNCIA' - CONSTITUCIONALIDADE.

                 1. O Estado detém competência concorrente para legislar sobre direito tributário (CF, art. 24, I); compete-lhe regulamentar o processo administrativo tributário". (ACMS n. 97.012971-8, da Capital, Rel. Des. Newton Trisotto, DJ de 29.3.01).”

                 No mesmo sentido:
                 "MANDADO DE SEGURANÇA - TRIBUTÁRIO - NOTIFICAÇÃO FISCAL - RECURSO ADMINISTRATIVO - EXIGÊNCIA DE PRÉVIO RECOLHIMENTO DO VALOR DA INFRAÇÃO, COMO CONDIÇÃO DE ADMISSIBILIDADE DE RECURSO ADMINISTRATIVO - CONSTITUCIONALIDADE - SEGURANÇA DENEGADA.

                 A legislação fiscal Estadual pode regular o processo administrativo tributário. E o artigo 141, incisos I e II, do Decreto n. 22.586/84, quando exige o depósito prévio em dinheiro do montante da infração, ou a prova de seu recolhimento anterior, não ofende o princípio constitucional contido no artigo 5º, item XXXIV, letra "a", da Constituição de 1988" (ACMS n. 98.011262-1, de Criciúma, Rel. Des. Solon d'Eça Neves).”

                 Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso voluntário.
                  III -DECISÃO:
                  Nos termos do voto do relator, decide a Câmara, à unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
                  Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Volnei Carlin e César Abreu.
                 Pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, lavrou parecer o Procurador Wlaumar Alves da Silva.
                  Florianópolis, 29 de agosto de 2002.
 João Martins
PRESIDENTE E RELATOR

BIBLIOGRAFIA:

BRITO, Maria do Socorro Carvalho. O processo administrativo tributário no sistema brasileiro e a sua eficácia. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4112>. Acesso em: 10 set. 2007.

DÊNERSON Dias Rosa, ex-Auditor Fiscal da Secretaria da Fazenda de Goiás / http://www.portaltributario.com.br/artigos/irresponsabilidade.htm.

FERREIRA, Ricardo J. www.editoraferreira.com.br

GERALDO Ataliba. Professor Titular das Faculdades de Direito da USP e da PUC / site google

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA.




[1] Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

[2] “Art. 195. Para os efeitos da legislação tributária, não têm aplicação quaisquer disposições legais excludentes ou limitativas do direito de examinar mercadorias, livros, arquivos, documentos, papéis e efeitos comerciais ou fiscais dos comerciantes, industriais ou produtores, ou da obrigação deste em exibi-los.”

JOSENILTON DE SOUSA E SILVA - acadêmico de direito da UNIVERSIDADE DE RIBEIRÃO PRETO - campus GUARUJÁ - 2007


domingo, 12 de maio de 2013

PAI CONTRA MÃE resenha

Este é um conto da obra: Relíquias de Casa Velha de Machado de Assis. Livro de domínio público disponível no site: file:///C/site/livros_grátis/contos_diversos.htm .
            Joaquim Maria Machado de Assis, nasceu no Rio de Janeiro, RJ, em 21 de junho de 1839, onde faleceu em 29 de setembro de 1908. É o fundador da Cadeira nº 23 da Academia Brasileira de Letras. Ocupou por mais de dez anos a presidência da A.B.L.
Cândido Neves, Candinho em família, era casado com Clara e os dois moravam, de favor, com a tia dela numa casa alugada. Ele tinha por ofício, depois de ter tentado muitas outras profissões, sem êxito, a ocupação de capturar escravos fugidos em troca de recompensa. Mas os tempos eram difíceis, os fugitivos eram escassos e a concorrência era muito grande. Os três; Candinho, Clara e tia Mônica, estavam passando por momentos difíceis quando souberam que Clara estava grávida. Apesar de esta trabalhar dobrado em suas costuras, não conseguia ajudar a família a sair da situação em que se encontrava. Para piorar as coisas, quando o bebê nasceu, eles receberam ordem de despejo por conta dos aluguéis atrasados. Sem outro recurso, eles foram morar num porão, por caridade de uma velha amiga da tia.
A tia Mônica, alegando que eles não teriam como sustentar a criança, sugeriu que levassem o recém-nascido à Roda dos enjeitados. Candinho, que estava contente, ficara, ao mesmo tempo, desesperado, pois a tia praticamente o obrigava a se livrar do filho, e se ele não o fizesse ela mesma o faria; afirmava ela. Entretanto, como chovia muito, ele decidiu que levaria o menino no dia seguinte. Naquela longa noite ele reviu todas suas notas de escravos fugidos. Um dos anúncios lhe despertou interesse, era o de uma mulata. Pagariam cem mil-réis por sua captura. Cândido Neves passou o dia a procurá-la, em vão. Finalmente chegou a inadiável hora de abandonar a criança. Candinho procurou fazer o caminho mais longo possível até a Rua dos Barbonos. Foi quando, inesperadamente, ele avistou a mulata fujona em uma das ruas do bairro. Num impulso instintivo, Cândido deixou seu filho numa farmácia ao lado e partiu em sua perseguição. A fugitiva não se entregou sem resistência. Mas foi levada ao seu dono assim mesmo. No caminho, a mulher se debatia e implorava para que a deixasse partir, revelando que estava grávida. Candinho nem ligou, arrastou-a brutalmente e a entregou no local indicado pelo anúncio... e recebeu a tão cobiçada recompensa. No chão, entre o medo e a dor , depois de algum tempo de luta, a escrava abortou. Cândido Neves não se comoveu com a dor da negra, seus pensamentos estavam no seu filho que havia ficado com o farmacêutico. Ao voltar, aquele pai se lançou sobre seu filho com a mesma fúria com que capturara a negra fujona, só que fúria de amor. Cândido  com o menino nos braços, mal agradeceu ao benfeitor e partiu depressa, não para a Roda dos enjeitados, mas para casa.
Após ouvir as explicações de Candinho, e principalmente pelos cem mil, a tia Mônica perdoou a volta do pequeno. Cândido, feliz com seu filho nos braços, abençoou a fuga e nem se lhe dava do aborto. “Nem todas as crianças vingam, bateu-lhe o coração”.
          Aquele pai tudo fez para ficar com seu filho e não se deu conta  de que uma mãe ficara sem o filho   dela. A felicidade daquele dependera da infelicidade da desafortunada mãe.    
          Os valores morais da época permitiam que esse tipo de situação fosse considerada normal. 
JOSENILTON DE SOUSA E SILVA - acadêmico de direito da Faculdade UNAERP Guarujá.